Obesidade é mais do que um fator de risco: é doença por si só, diz nova diretriz brasileira
BELO HORIZONTE* – Você já deve ter ouvido que sobrepeso e obesidade são fatores de risco para problemas de saúde, com destaque para doenças cardiovasculares. Ou seja, uma vez instalados, aumentam o risco desse desfecho negativo.
Mas, à luz de novas evidências científicas, especialistas apontam que esse entendimento pode ser limitado e, ao longo dos últimos anos, ter levado a uma inércia no tratamento dos pacientes. Eles são claros: obesidade é uma doença por si só e tem mecanismos diretos que podem afetar outros órgãos além do tecido adiposo, inclusive o coração e os vasos sanguíneos.
“Apesar de repetirmos que a obesidade é doença, os médicos acabam agindo, na prática clínica, com inércia, como se fosse apenas fator de risco. Ela não só é doença, como também impacta diretamente na trajetória dos pacientes de uma série de outras doenças, que acabam sendo vistas como comorbidades”, explica a endocrinologista Cynthia Melissa Valério, diretora da Associação Brasileira para Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso).
Essa visão renovada levou à criação de uma nova diretriz sobre obesidade e doença cardiovascular, que reúne 34 recomendações e foi apresentada na sexta-feira, 30, durante o Congresso Brasileiro de Obesidade e Síndrome Metabólica (CBOSM 2025), em Belo Horizonte. O documento completo será publicado no segundo semestre deste ano.
Em evento, médicos reforçam que obesidade deve ser encarada como doença crônica, e não como fator de risco para outras condições Foto: grinny/Adobe Stock
Fruto de uma parceria inédita entre cinco sociedades médicas — a Abeso, a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e a Academia Brasileira do Sono (ABS) —, ela recomenda que todos os pacientes adultos com sobrepeso e obesidade passem por uma avaliação do risco cardiovascular, a fim de direcionar o tratamento.
Para o cálculo do risco de uma pessoa desenvolver doenças cardiovasculares em 10 anos, eles propõem o uso de uma ferramenta desenvolvida pela Associação Americana do Coração (AHA, na sigla em inglês), chamado PREVENT (Predicting Risk of Cardiovascular Disease Events). O escore abrange diferentes etnias — embora não tenha sido validado na população brasileira —, faixas etárias e inclui, pela primeira vez, o índice de massa corporal (IMC) e a hemoglobina glicada (isto é, a média dos níveis de açúcar no sangue).
Segundo alguns dos especialistas envolvidos, a diretriz pode ser considerada um “marco histórico”. Seu lançamento ocorre em meio ao avanço das drogas antiobesidade da classe dos análogos do GLP-1. Nesse grupo, há a semaglutida (princípio ativo do Wegovy, a versão para tratamento da obesidade do Ozempic) e a tizerpatida (do Mounjaro).
No caso do Wegovy, por exemplo, estudos já mostraram uma capacidade de reduzir o risco de desfechos cardiovasculares graves mesmo em pacientes que não perdem o peso.
É válido lembrar que, em um passado não tão distante, alguns tratamentos para obesidade até aumentavam o risco de desfecho cardiovascular. “É uma mudança de paradigma”, frisou a cardiologista Fabiana Hanna Rached, da SBC. “Antes, nós (cardiologistas) nem tratávamos a obesidade. Primeiro porque era — e continua sendo — difícil, mas também porque não tínhamos drogas para isso. E as existentes aumentavam o desfecho cardiovascular nos pacientes de mais alto risco.”
“Pela primeira vez, temos condição de tratar esses pacientes, além de baixar peso. A complexidade (do tratamento) aumentou muito. Não basta mais só baixar peso”, afirmou o endocrinologista Marcello Bertoluci. Os três são autores da nova diretriz.
Uma doença por si só
Para Bertoluci, a mudança no entendimento da obesidade como uma doença crônica — e não apenas como fator de risco — ocorreu quando se reconheceu que ela é, na verdade, uma doença do tecido adiposo, responsável pelo armazenamento de gordura.
“Esse tecido, que teoricamente serve apenas para armazenar gordura, também exerce efeitos metabólicos (ou seja, participa ativamente do funcionamento do corpo) que variam conforme o fenótipo, a genética e a exposição aos fatores de risco ao longo da vida”, fala.
Assim, segundo o médico, quando esse tecido “adoece” — seja por predisposição genética ou pelo excesso de nutrientes, por exemplo —, pode se tornar disfuncional e inflamatório, favorecendo outras doenças. “A gordura pode se infiltrar em outros órgãos, como coração, rim e fígado, causando lesões, placas e danos ao endotélio (camada de células que reveste a parte interna dos vasos sanguíneos e do coração).”
Tratamento
Frente aos novos dados, a diretriz destaca o uso dos análogos do GLP-1 no tratamento. Há recomendação de utilizar a semaglutida e a tizerpatida em pacientes de alto risco.
O documento também cita a liraglutida, um primo mais velho e talvez menos conhecido dessa classe, e a cirurgia bariátrica. Esta última seria indicada sobretudo a pacientes com obesidade grave.
O Wegovy é o primeiro medicamento da classe dos agonistas do GLP-1 aprovado para reduzir o risco de eventos cardiovasculares maiores, como morte cardiovascular e infarto.
No Brasil, o recém-chegado Mounjaro só está aprovado pela Anvisa para tratar diabetes tipo 2, e aguarda aprovação para obesidade. Em outros países, como os Estados Unidos, isso já é uma realidade. Por aqui, então, o uso dele com essa finalidade é, por ora, considerado off-label.
Risco baixo?
A ideia do novo documento é valorizar as evidências científicas abundantes da relação com o sistema cardiovascular. Mas os médicos reforçam que isso não significa que quem não apresentar risco cardiovascular moderado ou alto para o coração esteja livre de preocupações. Isso porque o sobrepeso e a obesidade podem levar a comprometimentos em outros órgãos e estruturas. Na quinta, 29, foi divulgada uma diretriz mais ampla.
“Tudo que queremos aqui desse congresso é combater a inércia. Temos, sim, que escolher os tratamentos com base nas demais condições, mas temos que tratar (todos os pacientes)”, reforça Cynthia.
*O repórter viajou a convite da farmacêutica Novo Nordisk

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