Um novo decreto para regulamentar cursos EaD na saúde, mas desafios à qualidade permanecem
Em resposta à decisão liminar da Justiça Federal que suspendeu a autorização de novos cursos de graduação a distância na área da saúde, o Ministério da Educação (MEC) publicou, no dia 19 de maio de 2025, o Decreto nº 12.456/2025 e a Portaria MEC nº 378/2025, estabelecendo novas regras para a oferta de cursos superiores na modalidade EaD.
A medida foi tomada após a Ação Civil Pública nº 1015660-56.2022.4.01.3500, ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF), que apontou a ausência de regulamentação específica para garantir padrões mínimos de qualidade na formação de profissionais da saúde por meio do ensino a distância.
O novo marco normativo trouxe avanços ao vedar, de forma expressa, a oferta de cursos de graduação exclusivamente a distância nas áreas de Medicina, Enfermagem, Odontologia, Psicologia e Direito, reconhecendo a especificidade dessas formações. No entanto, o decreto permite que até 30% da carga horária dos cursos presenciais de Enfermagem, Odontologia, Psicologia e Direito seja cumprida por meio de atividades síncronas e assíncronas, o que ainda suscita discussões relevantes sobre os limites da virtualização do ensino em contextos que exigem forte base prática.
Além disso, o decreto permite a oferta semipresencial de diversos outros cursos da área da saúde, como Medicina Veterinária, Farmácia, Fisioterapia, Terapia Ocupacional e Nutrição. Essa possibilidade, embora regulamentada, expõe a formação de profissionais da saúde a riscos consideráveis, especialmente na ausência de critérios objetivos e rigorosos para o controle de qualidade pedagógica e da infraestrutura de apoio presencial.
A formação em saúde exige muito mais do que domínio teórico: ela pressupõe habilidades práticas, treinamento técnico supervisionado, tomada de decisões em situações clínicas reais e interação com pacientes em ambientes de cuidado. Assim, é cediço que a substituição ou redução excessiva dessas experiências por atividades mediadas por tecnologia pode comprometer aspectos essenciais da qualificação profissional.
Dados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) de 2023 (https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/avaliacao-e-exames-educacionais/enade/resultados) confirmam essa preocupação: apenas 6 dos 692 cursos EaD avaliados – menos de 1% – atingiram a nota máxima no Conceito Preliminar de Curso (CPC). Na área de Farmácia, por exemplo, 55,2% dos cursos EaD avaliados ficaram no conceito 2, enquanto nenhum recebeu o conceito 5 e outros 20,7% receberam conceito 1.
No que se refere ao curso de medicina Veterinária, que, diferentemente da Medicina, não foi incluído entre aqueles cuja formação deve ocorrer de forma totalmente presencial, é importante destacar um dado relevante: de acordo com os resultados do Enade 2023, 100% dos cursos ofertados na modalidade a distância obtiveram conceito 2, classificação considerada insatisfatória.
Esse resultado reforça a necessidade de repensar os critérios formativos adotados. Não há fundamentos pedagógicos que justifiquem a aplicação de diretrizes distintas para a Medicina e a Medicina veterinária, uma vez que ambas exigem uma formação consistente, alicerçada em sólidos conhecimentos teóricos, experiências práticas supervisionadas e acesso a ambientes laboratoriais, clínicos e hospitalares. Esses elementos são indispensáveis para o pleno desenvolvimento das competências profissionais, o que evidencia a importância de uma formação presencial robusta, capaz de preparar adequadamente o futuro profissional para os desafios concretos de sua área de atuação.
Ademais, cumpre salientar que, quando se observa o cenário dos cursos presenciais na área da saúde, verifica-se que, com exceção do curso de Medicina, na maioria dos demais o número de alunos matriculados nas IES privadas não tem preenchido integralmente as vagas ofertadas pelas instituições de ensino superior. Esse dado revela que não há uma necessidade social concreta que justifique a abertura indiscriminada de cursos de graduação na área da saúde na modalidade EaD, tornando-se evidente que a motivação para a ampliação da oferta de cursos de saúde a distância não está pautada unicamente em critérios pedagógicos ou em demandas do sistema de saúde, mas sim em interesses de natureza econômica.
Por fim, é fundamental reconhecer que, sem fiscalização adequada, não há como garantir a qualidade dos cursos EaD, especialmente em áreas que exigem infraestrutura prática, como os cursos da área da saúde. Isso porque a ausência de mecanismos eficazes de acompanhamento e controle compromete a credibilidade das instituições, a formação dos estudantes e, em última instância, a segurança da sociedade.
Registre-se que a necessidade de um processo de supervisão eficaz foi destacada em auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), a qual avaliou o planejamento da política de educação superior a distância. O relatório apontou que os mecanismos de avaliação dos cursos atualmente utilizados pelo Ministério da Educação (MEC) não são suficientes para mensurar a qualidade da formação dos estudantes. Além disso, o TCU identificou a ausência de uma política pública específica e bem estruturada para a EaD, bem como falhas nos processos de regulação, supervisão e avaliação conduzidos pelo MEC. Esses achados evidenciam a fragilidade do sistema de controle vigente e colocam em xeque a eficácia das ações destinadas a garantir a qualidade do ensino a distância no país.
Nesse cenário, a regulamentação atual, ao permitir a ampliação dos formatos semipresenciais em cursos da área da saúde, sem estabelecer com clareza os limites da modalidade e sem exigir comprovação efetiva de qualidade, abre margem para modelos de ensino que podem comprometer a formação plena e segura dos futuros profissionais.
A incorporação de tecnologias educacionais no ensino superior deve ser feita com responsabilidade, baseada em evidências e orientada por critérios que priorizem a formação ética, técnica e humana dos estudantes. Por isso, o marco regulatório precisa ser revisto, com foco na proteção do interesse público e no compromisso com uma educação de qualidade, que assegure a formação técnica, ética e prática dos profissionais da saúde.

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